18 de jan. de 2015

135. EDUCAÇÃO PELO MUNDO: ÍNDIA E SUAS CURIOSIDADES III


Na Índia há muitas sensações que não se nomeiam. Mas há as que são possíveis compartilhar. Assim, seguem mais algumas curiosidades desse interessante povo, de sua cultura e educação.

ATENCIOSOS
Num dos dias fui dormir bem indisposta e acordei sem hora. No café da manhã, o garçon adiantou-se antes de eu sentar perguntando-me se eu havia melhorado, se eu queria algo especial para comer. Como ele soube? Essas coisas acontecem na Índia. Atenção e cuidado.


GENEROSOS
Um dos princípios que notei nessa sociedade é que o bem estar de um depende do bem estar do outro. Com isso, tem-se um povo generoso, que contrasta com o nosso egocentrismo, egoísmo, bem estar próprio. Um exemplo: Estávamos numa favela ameaçada de destruição. Esgoto a céu aberto, casebres, cheiro muito forte, sujeira. Os moradores, ao nos notarem, vestiram suas melhores roupas e vieram timidamente conversar. Nada pediram. Pelo contrário, levaram-nos para um espaço que nos protegia do sol e do forte calor. Serviram água, biscoito e tchai, feito com especiarias, leite e chá preto. Eu pensava na procedência da oferta, enquanto observava tais vidas. Mais uma lição: O indiano é mais ação do que palavra. Brindamos com o tchái, apimentado, e dançamos deliciosamente uma ciranda.


OLHOS
O olhar do indiano é forte, intenso, triste, seguro, contemplativo. Atrai feito imã. Assim viu e sentiu o meu olhar.


NÃO COBIÇAM, NÃO OSTENTAM
“Impuro e desfigurante é o olhar do desejo. Só quando nada cobiçamos, só quando nosso olhar se torna pura contemplação, é que se abre a alma das coisas, a beleza.” Herman Hesse em Minha Fé.
Tentei explicar para umas adolescentes que o nosso povo é  consumista, valoriza o ter e o parecer. Mas isso não lhes fazia sentido. Afinal, pra que ter tanta coisa? O indiano parece ser feliz com o que tem. Não fica desejando, cobiçando ou ostentando. Tem o que necessita e se contenta contente. Perguntaram-me sobre a segurança no Brasil. Disse-lhes que não era país de todo seguro. Havia muito roubo. Exatamente, porque diferente deles, nós cobiçamos e ostentamos. Damos mais valor ao que tem o ser exterior, enquanto eles primam pela evolução do ser interior. Isso faz uma diferença!



SER E TER
Eles são muito voltados ao eu interior, ao seu desenvolvimento e a sua elevação. Talvez o  sistema de castas tenha os ajudado a serem assim, como o próprio hinduísmo que ajuda o indivíduo a experimentar a divindade e a encontrar a verdadeira natureza de seu ser. Esta valorização se mostra também em metáfora nas construções. Fui a alguns apartamentos e casas de indianos de classe média-alta e alta. As contruções eram velhas, sujas, sem trato. Mas o interior das casas era repleto de obras de artes, móveis bonitos, decoração requintada e de bom gosto. Ou seja, maior valor no interior em detrimento do exterior.




SEGURANÇA
Em meio aquela multidão raras vezes me senti ameaçada, e as que me senti foram muito mais pela minha herança cultural do que pela situação. Claro que num país populoso desse fica-se tenso. Mas pude relaxar minhas neuroses de prevenção contra roubos e furtos de objetos ou de vida. Como é bom! Sempre sinto isso quando saio do país. Mas, de novo, a Índia me surpreendeu. E, fiquei tão relaxada nesse quesito que no meu último vôo dessa jornada já a caminho de casa, fui passar no RX e encontrei um casal de italianos com problemas e fui ajuda-los. Segui com eles conversando e só depois de 50 minutos, graças ao atraso do vôo, é que me dei conta de que havia esquecido minha mala de mão no RX. Voltei correndo, e no Brasil, a encontrei. Ufa! Viva!



PROPINA
Bem evidente a corrupção no trânsito indiano. Nosso ônibus ou carro eram sempre parados. Conversavam em hindi, mas pelo tom do diálogo e pelas rupias passadas pela janela, era fácil imaginar o que acontecia. Mas um dia, a briga parecia grande. O motorista era acusado de falar no celular. Lá se foi mais uma nota. Curioso é que o motorista não tinha celular. Coisas da Índia!

NÓS E ELES
Corrija-me se eu estiver errada,
Nessa rápida generalização.
Os indianos focam mais o ser.
Os brasileiros mais o ter.
Os indianos focam o interno.
Os brasileiros, o externo.
Os indianos tem milhões de deuses.
Os brasileiros um único Deus e milhões de deusezinhos.
Na Índia há várias línguas
No Brasil apenas uma já une.
A quebra da moral aos indianos anuncia a vergonha.
A dos brasileiros, a culpa. Minha culpa, minha tão grande culpa.
Os indianos buscam a felicidade a partir do que tem.
Os brasileiros almejam a felicidade a partir do que não tem.
Os indianos...
Os brasileiros...


No próximo post, falarei de alguns projetos educacionais bem interessantes que por lá conheci. Acompanhe, comente, aumente o conhecimento. Deixe aqui a sua contribuição. 

13 de jan. de 2015

134. EDUCAÇÃO PELO MUNDO: ÍNDIA E SUAS CURIOSIDADES II


A educação diz da cultura, que diz do ser. E na Índia, quase tudo tem um sentido. Assim seguem outras curiosidades que contextualizam o cenário vivido e nos ajudam a refletir também sobre nós e a nossa cultura onde se insere a educação.








NAMASTÊ E SHUKRIÁH
Duas palavras mágicas. Shukriáh quer dizer obrigado. E eles ficam bem felizes ao ouví-la. Namastê é uma maneira respeitosa de cumprimentar ou iniciar uma conversa e quer dizer algo como: O meu deus interior saúda o seu deus interior. É palavra que se diz também com corpo. Junta-se as palmas das mãos e curva-se o corpo. E é mágico o que acontece quando os corpos se curvam.  


PÉ NO CHÃO
 Em todo e qualquer lugar que se vai é preciso ficar descalço. E não só em interiores. Por isso, nada melhor que uma prática sandália que se tira e põe. Alguns turistas usam um sapato de algodão específico para tais locais. Mas como viver e sentir a Índia sem ter os pés no chão?


DIVERSIDADE
A Índia é pluralista, multilíngue e multiétnica, e é de uma plasticidade estonteante.  A língua mais falada é o Hindi, embora o Ingles seja uma língua bem difundida e que traz oportunidades. Há deuses aos milhões, e há diversas formas para adorá-los, pois a verdade única pode ser vista de diferentes formas e pessoas. Para Herman Hesse, o indiano é o povo mais genial da Terra em termos de religiosidade. No livro Minha Fé, diz que o hinduísmo, a religião dominante no país, com capacidade de transformação criadora, e em milhares combinações, admitiu elementos estranhos com infinita generosidade e tolerância. Exatamente como os rostos e figuras dos deuses hindus de vários braços, tem essa religião mil rostos, primitivos e refinados, infantis e másculos, suaves e sombrios em seus diversos e contraditórios dogmas, ritos, mitos, cultos todos convivendo pacificamente.
Exatamente como vi. E o respeito a diversidade pareceu-me um dos pontos alto desse país, ainda que se veja longos e sangrentos conflitos como no Paquistão e Caxemira.


ASHRAM
Estive em alguns e são fundamentais para acalmar a alma e o ouvido das buzinas. Na antiga Índia servia como eremitério hindu para os sábios. Hoje funcionam como um centro para promover a evolução espiritual dos seus membros, orientados por um líder religioso ou um místico. (foto ashram urbano) Talvez o mais importante que fui seja o SATYAGRAHA ASRAM, a beira do Rio Sabarmati, em Ahmedabad, onde Gandhi morou por 12 anos, formou uma escola, desenvolveu uma  filosofia (SATYA significa verdade e AGRAHA significa firmeza, constância) para o movimento de resistência a não-violência na Índia em prol da Independência do país, que ocorreu em 1947. Seis meses depois foi assassinado. Hoje esse Ashram é um museu com pinturas, fotos, cartas, manuscritos, relíquias pessoais, livros, ou seja, memórias concretas que dizem da vida de Gandhi. E como ele dizia: “A minha vida é a minha mensagem.” Mensagem que deixou clara: “Be the change you wish to see in the world.” (Seja a mudança que você deseja ver no mundo.) Há ainda em funcionamento um centro para crianças órfãs, que dá educação e envolve as crianças em trabalhos manuais junto com a comunidade e as vendem em uma loja local. Roupas, bolsas, almofadas, sacolas de presente, caixas, tudo feito a mão.



ALIMENTAÇÃO
Poderia resumir a comida indiana em uma palavra: PIMENTA. Come-a do café ao jantar, num prato grande acompanhado de potes menores para as várias opções, na maioria vegetariana. Difícil era degustar os alimentos que nos faziam soltar fogo pela boca e ventas. Dizem que a pimenta esteriliza os alimentos. E acostumam-se desde cedo. Em geral, as crianças mamam por um ano, sendo logo introduzidas ao ardor. No meu caso, os doces (Hum...) me salvaram. Deliciosos. Curioso... (e dica implícita). O alimento é comido com a mão direita. A esquerda é usada para se limpar. Há também talheres, mas pouco usam. E é bem comum, colocarem a mão em nossa comida ensinando-nos a prepara-la.
A cultura não é uma maravilha? Como ousar dizer qual está certa?

No próximo post um pouco mais da Índia. Acompanhe, comente, aumente o conhecimento. Deixe aqui a sua contribuição.

7 de jan. de 2015

133. EDUCAÇÃO PELO MUNDO: ÍNDIA E SUAS CURIOSIDADES I


Fomos a 6 cidades na Índia. Mumbai, Bangalore, Pune, Ahmedabad, Agra, Nova Delhi. Visitamos Universidades, escolas, projetos educacionais,  favelas, templos, monumentos, ashrams, museus. Participamos de rituais, laboratórios e eventos ricos em trocas culturais e pessoais. Jantares e encontros com mentes brilhantes, gente interessante e comidas picantes. E ainda de redondas rodas de ciranda que nos colocavam, brasileiros e indianos, no mesmo fôlego e compasso, mais do que no BRICS.
Dessas experiências, iniciarei compartilhando curiosidades que contextualizam o cenário vivido para então chegar à educação.

POPULAÇÃO:
Eu achava que o Brasil era populoso, mesmo já tendo ido à China. Mas desta vez foi diferente. Talvez eu tenha sentido mais as pessoas. Entre no Taj Mahal e sentirá o que quero dizer. Sei que achei o nosso país pequeno. A Índia tem 1 bilhão e 200 milhões de habitantes. Um bilhão a mais do que nós! Imagine a Finlândia com seus 5 milhões! Relativo. Tudo é relativo.


CURIOSA PROPORÇÃO:
Perguntei a um guia qual a proporção entre homens e mulheres, visto que se vê muito mais homens pelos lugares. Achei curioso o modo como respondeu: “Para cada mil homens, 900 mulheres.” Nós usaríamos a proporção 10 para 9 ou no máximo 100 para 90, não é? Afinal, somos apenas 200 milhões! Tudo é relativo!

POLUIÇÃO E CORES:
As cidades possuem construções antigas e mal cuidadas, sendo marcadas pela cinzenta e densa poluição. Mas, da monocromia cinza brotam cores vindas das vestimentas, das especiarias, das pinturas e decorações. Mandalas de flores espalham-se pelos lugares, colorindo e embelezando o ambiente. Um charme! Enquanto a poluição promove lindos pores do sol, avermelhando em espetáculo os vários tons de cinzas. E mais uma vez, as várias conexões caóticas, neste caso, das cores, não agridem o olhar, mas deixa tudo lindo! Coisas da Índia.


VESTIMENTA:
Há duas roupas bem comuns entre as mulheres, sempre com lenços, caximiras, panos, muitos panos. O sari é composto por um tecido de 6 metros que se enrola ao corpo. Usa-se com um top. E o shalwaar kameez que é um conjunto de calça, túnica e dupatta (echarpe), usado e aprovado por mim. Ultra confortável. Entre os homens se vê dhoti, um pano enrolado no corpo como se fosse saia, mas é mais comum o kurta pajama, que é a bata longa com a calça. Mas se vê muito homem de calça e camisa, na maioria xadrez. E entre os jovens começa-se a se ver os efeitos da globalização e ocidentalização.
Curioso... Os saris mostram a barriga. E está tudo bem até nas mais foras de forma ou mais velhas. Mas ouse mostrar as pernas! Adoro essas construções feitas pela cultura! Ajuda a refletir também a nossa!

ASSESSÓRIOS E CIA:
O assessório costuma ter muita cor e brilho. O mais frequente é o bindi, uma marca na testa. São de várias cores e formatos e são várias as histórias de seu simbolismo. Em suma, o chamado terceiro olho ou olho da sabedoria, é para os hindus um dos pontos mais importantes do corpo. Serve como proteção e para a concentrausam a  homens gostam da tintura e comportamziam: ção  do eu interior no verdadeiro mundo, o espiritual. Corresponde a intuição, percepção e desenvolvimento do conhecimento. E em muitos lugares é-se recebido com a marca. Muitas mulheres também pintam a fronte na raiz do cabelo emitindo sinais culturais: é casada. E é comum homens com hena.


TRÂNSITO:
Sabia que o transito na Índia era uma loucura, mas não imaginava o quanto. É experiência com emoções andar de Tuk Tuk (Oto) em meio a tantos outros, a tantas pessoas, buzinas, carros, motos, ônibus, a tantos tudo tão próximos do corpo! Pode-se ainda deparar-se com vaca, camelo, macaco, elefante em meio a pista. Sinal vermelho e verde? Existe, mas não tem serventia. É na base do “Salve-se quem puder” e do “vai ou vai”. Incrivelmente, raríssimos são os acidentes, atropelamentos, brigas, xingamentos. E vê-se muita coordenação,  percepção, habilidade espaço-temporal e flexibilidade dos que participam desse caos loucamente embalado a muita buzina. Os indianos diziam: “Buzinar é costume.” Mas como saber qual a buzina é para você? Eles não sabiam. A buzina parecia ser apenas um som da Índia.

Na próxima postagem, outras tantas curiosidades. Acompanhe, comente, acrescente.

5 de jan. de 2015

132. NOVA SÉRIE “EDUCAÇÃO PELO MUNDO”: ÍNDIA: PRIMEIRAS IMPRESSÕES.


Fui a Índia com alguns propósitos. Entre eles, pesquisar, in loco, projetos educacionais transformadores e voltados à educação de qualidade, como tenho feito em outros países. Apreender da cultura. Vivenciar e potencializar os sentidos e o ser. E, realmente não dá para voltar igual ou indiferente da Índia. Liderados pela encantadora Vashima Goyal da Eduretreat e com o imprescindível apoio da Avante Educação e Mobilização Social, lá fomos nós conhecer desse país tão cheio de mistérios. Sempre que vou a um país, procuro estudar um pouco antes e ampliar minha imaginação sobre ele. E sempre me surpreendo com a diferença entre o que imaginei e o que reamente é. Ansiava conhecer a Índia, mas preocupava-me os estupros, a pobreza, o lixo, as contaminações, os religiosos mais radicais. Mas, a Índia já de cara te pega de jeito e transforma o seu olhar. Junto com ele o seu sentir. E aí a viagem começa.  Mas sabe quando você vê uma lua linda, enorme, brilhante e tira uma foto? O que vê na câmera? Uma bolinha branca bem diferente da lua que se viu. Falar da Índia é mais ou menos assim. País para ser vivido, muito mais do que contado. É país de sentidos, de olhares, de metáforas. É país que se conecta com o caos em múltiplas e diversas conexões, mas que magicamente mostra harmonia! País da flexibilidade, diversidade, integração, barulho e silencio. País que produz em nós coisas que não se nomeiam. E tantas outras para compartilhar. E é o que aqui farei.
Inicia mais um EDUCAÇÃO PELO MUNDO. Vamos nessa?