Há 19 anos, no dia 1º de Outubro eu estava inquieta. Deitei-me num
banco ao ar livre com uma imensa barriga e fiquei a olhar a lua que estava
cheia como nunca vi igual. Na manhã seguinte, dia 2, a caminho da hidroginástica
notei que a bolsa havia estourado. Era você querendo nascer e logo seus olhos
azuis estavam a me fitar. E nestes 19 anos quanta história boa de contar! Você parece
ter nascido arteira, moleca, independente, criativa, engraçada, justa,
carinhosa, beijoqueira e com personalidade forte. Ficava horas concentrada com
seus brinquedos e atividades desafiando as pesquisas sobre a primeira infância.
Aos 3 meses tomou o primeiro banho de mar com grande alegria. Aos 9 meses
disse: “Mamã”. Ufa! Aos 10 meses deu os primeiros passos e arrastava cadeiras
por todos os lugares. Com um ano entrou na escola e se virava muito bem apesar
dos colegas serem um ano mais velhos. Em seu primeiro ano amava puxar o rolo de
papel higiênico e sair por toda a casa. E quando me via, e sabendo estar
errada, pegava a pontinha do papel e assoava o nariz. Que figurinha!
Aos 2 anos, pedi que chamasse o elevador para
adiantar. Foi até ele e gritou: “Elevadorrrr!!!” Lição preciosa a mim. Na mesma
época pulou na piscina funda argumentando que sabia nadar. Afundou, engoliu
água, tentou sair até que a resgatei. Arregalou os olhos, cuspiu parte da água
engolida e me disse: “Não falei que eu sabia nadar!” Ai ai! Logo começou a contar
mais do que dez e percebeu algo fantástico. “Dez e seis, dez e sete, dez e
oito, dez e nove, dez e dez!” Viva a lógica infantil! Aos 3 anos inventou uma
mãe. Maria Chiquinha deixava comer doces a toda hora, dormir a qualquer hora e
fazer tudo o que eu não deixava. Um dia, desafiando-me disse que preferia morar
com ela. Eu já estava cansada e enciumada desta mãe. Pedi que arrumasse suas
coisas, pegamos o carro e você foi me orientando. Rodamos, rodamos, rodamos até
que me pediu para parar e disse: “Mãe, a Maria Chiquinha engoliu uma espinha de
peixe e morreu. Vamos voltar prá casa?” Aos 4, ao sair para o trabalho você me
chamou e disse: “Mãe, não se deslembra que eu te amo, viu?” Aos 5, disse-me:
“Mãe, você pode me disciplinar, mas eu não concordo, porque você não está
respeitando as diferenças.” Pode? Com a mesma idade já amarrava seus sapatos,
comia e tomava banho sozinha, andava de bicicleta sem rodinhas e aprendeu a ler
e a escrever, mas sempre gostou de objetividade. Lembro de uma história que
deveria ser escrita em 20 linhas. Deu seu jeito. Na primeira linha colocou o
príncipe e a princesa se encontrando, casando, tendo filhos e nas demais 19 linhas
escreveu um prolongado viveram felizes para sempre. Aos 6, simularam uma
votação na escola para presidente, pois o país vivia esta escolha. Indagou-me:
“Por que não conheço os candidatos?” E eu retruquei: “Não os conhece?” Você
citou o nome de todos, mas disse que não conhecia a proposta e que o voto
deveria ser consciente. Que maravilha! Aos 7, chegando na escola para buscá-la recebi
os parabéns de uma mãe. Logo descobri que você havia ganho uma olimpíada de
Matemática e eu nem sabia que você havia se inscrito. Esta é você. Faz as coisas
para si, para o seu prazer e desenvolvimento e não para se autopromover ou
receber elogios.
Como me ensina! Aos 8
voltou da escola indignada com uma injustiça feita a um colega. Lutou
bravamente por ele. Aos 9 fez biscoitos e os vendou pelo prédio para pagar um
picolé que havia comprado fiado. E entrou no time de futebol, mesmo sendo a
única menina. Aos 10, empenhou-se firmemente nas artes e por um bom tempo se
dedicou a ela. Aos 11 passou o aniversário internada sem perder o brilho e sem
se lamentar. Aos 12 concluiu que o par ou ímpar não tinham as mesmas chances, e
que pedir par era vantajoso, pois ímpar com ímpar dá par, par com par dá par e
apenas par com ímpar dá ímpar. Bonito vê-la questionando o que lhe era apresentado
como verdade. Aos 13 ganhou troféu por estar entre as melhores alunas da escola.
Aos 14 fez uma linda apresentação teatral, mesmo não ganhando o papel que
queria. Aos 15 foi para o Canadá e lá brilhou. E a pedidos da coordenação do programa
ficou por mais 6 meses. Aos 17 passou na faculdade e foi morar sozinha,
assumindo todas as tarefas. Aos 18 tirou carta, trabalha, estuda, namora, faz
atividades físicas. Bravo! Aqui estão alguns flashes de sua vida apenas para
dizer: Que orgulho de você! Chorou, sorriu, amou, errou, acertou, brincou, machucou-se,
mostrando em tudo o que fez e faz a sua maturidade, cuidado, afeto, inteligência,
compromisso, dedicação, determinação, justiça, autonomia, responsabilidade e
muita sabedoria. Sou sua fã, Camila. Parabéns pela vida tão linda que tem
construído. Muito feliz pelos frutos que temos colhido. Continue lindamente a
sua história.
Com imenso amor,